Por Kimbanda Kiluwakonga wa Exu Pinga Fogo
@tatakamuxinzela | @covadecipriano | @quimbandanago
Em primeiro lugar, gostaria de expressar o quanto tenho gargalhado de certas situações nos últimos dias. Existe uma inflamação na internet por parte de outras casas de Quimbanda que em nada se adequa a realidade dos fatos. A citar alguns:
Sou um homem-trans iniciado na Cova de Cipriano Feiticeiro, domínio de Exu Pantera Negra e Pombagira Dama da Noite.
Eu e o Táta bebemos do mesmo sangue, e se me torno mais forte, é pela outorga de sua Faca. Minha relação com o meu Exu se fortifica a partir dos seus ensinamentos e da Mameto, e todas as vezes que o negócio apertou na vida, sempre recebi auxílio, orientação e amparo, além de força.
É muito estranho ter que dizer isso, porque nunca achei que viesse a ser necessário, mas para deixar muito esclarecido aos inventores de histórias criminais: nunca, em nenhum momento o Táta, a Mameto ou qualquer irmão meu me tratou de forma diferente de qualquer membro da família – ao contrário desses lugares com o discurso de acolhimento em que você entra com uma placa trans na testa, e todas as suas relações ali são pautadas em torno disso, para o agrado da consciência do outro que se coloca ali em uma posição quase como se estivesse fazendo uma caridade para você. Eu não preciso de caridade.
A Cova de Cipriano Feiticeiro não é uma casa de caridade.
Deixei expresso que sou trans desde o primeiro contato, por medo devido a experiências passadas de que isso viesse a ser um impedimento de alcançar qualquer posição que me fosse de direito por honra e por mérito. Me recordo (rindo) da incompreensão do Táta, simplesmente por mais que eu explicasse não entrava na cabeça dele o porquê isso poderia vir a ser algum problema ou impedimento. E sinceramente, me espantou desde o começo o carinho com o qual eu fui tratado e recebido em minhas questões, mesmo sem ele entender, tanto pelo Táta quanto pela Mameto, carinho com o qual tratam qualquer questão ou dificuldade que eu venha a apresentar.
O Táta é desinformado sobre o universo trans e isso tampouco interessa a ele, e nunca me foi dirigida sequer uma pergunta indelicada (novamente, ao contrário dos discursistas pró-todo-mundo), embora eu já esteja muito mais à vontade dentro da família.
Vi que vocês imaginam muito, imagina o que não deve fazer no privado.... Vou te contar, torto das ideias: sentamos na mesa juntos e comemos carne, conversando sobre qualquer coisa. Tenho minhas dúvidas esclarecidas. Admiro os posicionamentos internos que só quem é da família acompanha. Sou tratado como igual até mesmo apesar da idade e tenho tudo o que preciso e mereço. Admiro meus irmãos mais velhos e trabalho para carregar essa honra que vejo neles.
Que pena ter que se apoiar em um discurso infundado sobre quem quer que seja, ou em uma falha social que te colocará com as vestes de bom mocinho por fazer o mínimo, para ter o seu trabalho mais bem-visto aos olhos externos (coisa que nunca foi da natureza da Quimbanda!).
Aqui na Cova de Cipriano Feiticeiro, somos reconhecidos pelo bom trabalho mesmo. Também deve ser difícil ter a lealdade dos seus condicionada a emissão ou não de um posicionamento social massificado, e não na confiança plena na sua palavra, na sua outorga e nas virtudes que ela comporta (dentre elas, o respeito).
Mas cada um que sabe do seu né: De mameto vir no meu privado (um recém-iniciado de outra família) falar do meu Táta sem saudação alguma e com direito a block... já vi de tudo nessa vida. Se esse é o respeito e acolhimento que você prega aos quatro cantos, pode ficar com ele.
Se essas pessoas estivessem preocupadas com o conhecimento, certamente os discursos seriam outros, e enquanto fizeram aí seus posts de lindezas anti-transfóbicas da Quimbanda, já tem mais três artigos novos para estudar no site.
Pelos textos ou pelas palavras anteriores do Táta, não existe impedimento algum (tiraram isso das fantasias de vocês, aparentemente o Táta é o novo Diabo no imaginário brasileiro) de que um transgênero chegue a ser Mestre de Quimbanda na família. Um homem-trans se torna fundamentalmente mameto por seus fatores biológicos e espirituais que isso carrega, dentro da nossa tradição.
Venho de tradição Nórdica, e igualmente na tradição você precisa ser possuidora de um útero para chegar a ser uma Völva (sacerdotisa maior), e isso nunca dependeu de opinião social alguma das outras Völlur ou da comunidade que deve reconhecê-la (veja bem, em uma comunidade onde era comum os praticantes do Seiðr que mudavam de gênero ou eram algo social além do homem e mulher, os Seiðberendr, conhecidos hoje nos kindreds voltados para o xamanismo nórdico como os entre mundos).
A tradição é tradição e ela não vai se conformar a mim, e qual é o problema? Os únicos que estão chorando são vocês, que nem sequer são transgênero. E por acaso eu me conformo a tradição?
Percebem que a lei da troca nunca falha? Aos bons-mocinhos e salvadores da pátria: Isso aqui é Quimbanda!
Alguém perguntou se por acaso eu, pessoa trans, quero que a tradição se adeque a mim, antes desse fogaréu todo? Estou muito bem consolidado dentro da minha família.
Me certifiquei de ter claro para mim mesmo que entraria pra Quimbanda buscando construir o império do meu Exu, e não buscando uma casa de acolhimento, e diferente do que tenho visto por aí, na Cova de Cipriano o foco é o Exu e seu domínio, a deificação da alma, a feitiçaria, o trabalho. A Cova de Cipriano Feiticeiro não é uma casa de acolhimento!
E digo mais: se um dia eu tiver a honra e a felicidade de me tornar mameto, tenho a mais absoluta certeza de que todos os meus irmãos estarão em festa como seria com qualquer outro, de que cumprirei com o meu papel com excelência e de que se for reconhecido será pelo meu bom trabalho, característica da Cova de Cipriano Feiticeiro.
Nguzo ê!